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Fraternidade e Ecologia Integral (Parte 2)

O senhor acredita que, se não houver uma mudança nas atitudes individuais e coletivas, podemos vir a enfrentar um colapso planetário em breve?

Sem dúvida. A situação planetária é muito grave. É muito triste dizer isso, mas, por falta de compromisso da comunidade internacional, dos chefes de estados e das grandes corporações, estamos caminhando para um suicídio planetário. Isso me deixa muito triste, porque eu tenho filhos e me preocupa saber em que mundo meus netos irão viver ou sobreviver. Nós, cristãos, somos movidos pela esperança, acreditamos que podemos mudar. O nosso Deus é o Deus da vida é o Deus da ecologia integral. Precisamos aproveitar o ano do Jubileu, que nos convida a esperançar e partir para uma caminhada de justiça socioambiental, em busca de uma nova relação com Deus, com as outras pessoas e das pessoas com a natureza.

 

Por onde começar essa mudança?

Vamos começar por nós. Sabemos que a Campanha da Fraternidade não chega a todos os recantos do Brasil, mas, vamos fazer a nossa parte, iniciando um processo de conversão ecológica, mudança de estilo de vida; deixando o consumismo descontrolado para só consumir o que precisamos; não acumular e evitar o uso de material descartável e de uso único. Enfim, a CF2025 apresenta uma série de sugestões para auxiliar nessa nova etapa de nossas vidas.

 

Caso não haja esse cuidado, o que pode vir a ser mais prejudicial para a humanidade em termos ambientais?

O planeta está à beira de um colapso ambiental; já ultrapassamos seis dos nove limites que poderíamos ultrapassar para garantir um planeta habitável para o ser humano. Não queremos dizer que o planeta está a desaparecer; quem vai desaparecer é a espécie humana. Esse é o grande problema: o que está em jogo não é a vida do planeta, é a vida humana, é a nossa extinção que está em risco. Já passamos por cinco extinções em massa e o planeta não desapareceu. Na quinta extinção desapareceram os dinossauros, porém esse processo de extinção levou milhares de anos; já a nossa espécie irá desaparecer bem mais rápido. A temperatura média da terra, em relação à temperatura do período pré-industrial, já subiu 1,5°C, causando mais impactos ambientais do que os 125 mil anos antecedentes. Se a COP de Paris, de 2015, tivesse cumprido seus acordos, não teríamos atingido esse aumento num espaço de tempo tão curto, mas já faz 16 meses seguidos que não baixamos de um grau e meio e, se chegarmos a 2°C, 3ºC, vamos ter um colapso ambiental, com falta de água potável, degelo das calotas polares e dos glaciares, ondas de calor acima dos 40°C, que levarão à morte milhares de pessoas, pois o nosso corpo não está preparado para esse aquecimento.

 

O Papa Francisco abraçou a causa da ecologia de uma forma muito profunda. É fácil levar a ideia para a Igreja como um todo?

Eu digo que o Papa é o nosso novo Francisco de Assis, o “Francisco de Roma”, agora com a incumbência de restaurar toda a Igreja Católica. Ele está travando uma luta desigual. Além de ter que tratar com as autoridades mundiais, enquanto chefe de uma nação, ainda sofre resistências internas. Há muitos padres e bispos que têm um olhar de indiferença para as questões do Cuidado da Casa Comum. Já ouvi de alguns que o Papa não tem que cuidar das questões ambientais, pois isso é assunto para ecologistas e cientistas, enquanto outros consideram que o papel do padre e do bispo é salvar almas. E eu lhes digo: se você não cuidar do planeta, não terá almas para salvar.

 

Quais são as maiores dificuldades no enfrentamento à crise ecológica no Brasil e no mundo?

Considero que a maior dificuldade é o negacionismo e a indiferença. As pessoas não perceberem, ou não quererem perceber, a atual crise planetária. A crise climática é o problema mais grave que temos, porque ela coloca em risco de morte a espécie humana. No Brasil nós temos dois problemas seríssimos, que influem na crise planetária: o desmatamento e a pecuária e o agronegócio – é preciso deixar claro que o agro não contempla a agricultura familiar, que é a solução para a produção de alimento no planeta. Os dois juntos lançam 75% de todos os gases de efeito estufa na atmosfera. Mas ainda temos outras situações graves, como a poluição em todas as suas formas e o desrespeito às leis ambientais, quando os governos permitem que se construa sobre os rios ou em suas margens, não respeitando os 30 metros da mata ciliar. Temos ainda a poluição hídrica, que hoje é um grande problema para a vida marinha; ocupação desordenada do solo; o crescimento acelerado das cidades, aliado à falta de acesso aos serviços básicos de saneamento; e o avanço de atividades econômicas exploratórias.

 

Ideologia, política e aspecto geográfico podem ser complicadores para implementar a ecologia integral? Por quê?

Sim. Eles são o nosso grande calcanhar de Aquiles, porque o mundo é regido por políticas e por ideologias. São os interesses econômicos associados aos interesses políticos e ideológicos.  Não fosse isso, bastaria seguir as orientações do Papa em sua Encíclica Laudato Si' e na sua Exortação Apostólica Laudate Deum, que estaríamos no caminho da restauração da nossa Casa Comum.  Mas, a situação é crítica e nós precisamos enfrentar com esperança. Precisamos assumir um compromisso com a Ecologia Integral, assumir uma forma de economia que mude a lógica do mercado. Trago aqui como exemplo a Economia de Clara e Francisco, proposta pelo Papa Francisco aos jovens do mundo, de viver sem deixar-se envolver pelos atrativos do mercado e do consumismo exagerado. Não precisa voltar para a idade da pedra, mas viver de forma mais simples. Se não fizermos isso, não vamos ter vida. Eu sempre lembro aqui de um versículo do Evangelho de Marcos (8, 36), que diz: “De que adianta o homem ganhar o mundo se perde a sua própria vida?”.

 

PROF. DR. TELMO PEDRO VIEIRA

Movimento Laudato Si

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